Podem os tempos passar, se afogarem nas águas do mar, mas as memórias dos tempos, enquanto houver gente na Terra, jamais serão esquecidas!

Muitas são as lendas que as pessoas puras da serra do Montemuro me contaram e continuam a contar!

Cada penedo esconde segredos e mistérios que alimentam a curiosidade e até o medo de quem as ouve!

São lendas sobre os penedos que desafiam o desgaste dos séculos!

Já ouviram a Lenda dos Penedos Vazios ou Mal Seguros ou dos Penedos que Baloiçam?

Eu ouvi-a na década de setenta quando logo pela manhã, subia a serra, rasgando caminhos para ir de Vila Boa até Pimeirô!

Acompanhava-me a " tia" Palmira, uma senhora que tinha um coração maior que a serra!

Certo dia, ao passarmos por um penedo que parecia ir cair a cada momento, disse-lhe:

- " Tia" Palmira, vejo tantos penedos fixos no chão, apenas por um pedacinho de pedra!

Eles não irão soltar-se em dias de tempestade e rolar serra abaixo?

A tia Palmira sorriu e contou-me uma das muitas lendas que lhe ouvi, sempre que me dava guarida na sua casa, em Vila Boa, em dias de chuva torrencial.

Era uma vez, uma pastorinha que logo pela manhã, tirava o rebanho do curral e levava-o para o monte pastar.

Gostava muito de se encostar nos penedos a fazer tranças de colmo que a sua mãe vendia depois aos almocreves. Essas tranças serviam para fazer chapéus de palha e cestaria.

Certo dia, reparou que um sardão estava no penedo e a olhava insistentemente.

A menina parecia encantada com aquele olhar e não sentiu medo algum. Levantou-se e uma voz muito doce, vinda do sardão, pediu-lhe que lhe matasse a fome com o leite das cabras.

A pastorinha que era uma boa menina, pegou numa pedrinha que tinha uma buraca e mugiu a cabrinha para lá. Depois, foi pô-la junto do sardão que bebeu o leite sofregamente.

A partir desse dia, mal a menina chegava ao pasto, o sardão aparecia vindo de uma fresta que o penedo tinha.

A menina repetia o mesmo gesto.

Mas... Passados uns dias, a cabrinha passou a dar menos leite, ao ponto de já não chegar para ela beber.

O seu coraçãozinho começou a ficar muito triste, pois iria deixar de ter leite para matar a fome ao sardão, mas quanto maior era a tristeza dela, mais alegre sentia o sardão!

Quando o leite da cabra secou por completo, nunca mais o animal apareceu à pastorinha o que a angustiou bastante!

No seu pensamento o sardão tinha morrido à fome!

Numa manhã de S. João, a menina ao chegar à pastagem, assustou-se vendo um rapaz sentado no penedo, precisamente no mesmo sitio, onde antes aparecia o sardão.

Como nunca tinha visto aquele rapaz, chamou o gado e preparava-se para ir embora para casa.

Nesse momento, o rapaz chamou-a e sossegou-a, dizendo:

- Espera, não vás embora! Eu sou o sardão a quem tu deste de comer! Se não fosses tu eu teria morrido. Preciso ir para minha terra que fica muito longe!

Meus pais foram perseguidos pelos cristãos e ao fugirem deixaram-me aqui encantado!

Acharam que desta forma me iriam salvar a vida!

Dito isto, meteu a mão ao bolso, tirou uma bolota enorme de ouro e deu-lha, dizendo:

- Guarda em segredo esta bolota.

A fresta do penedo, assim que eu for embora, vai fechar.

Deixa passar sessenta noites e depois volta aqui e traz essa bolota.

Coloca-a no lugar, onde estava a fenda e o penedo irá abrir-se.

Leva o tesouro que lá está para tua casa.

Tu e tua família irão ser muito felizes e nunca mais passarão privações!

Mas, cuidado, se revelas o nosso segredo, eu voltarei a ser um sardão e o teu rebanho morrerá!

A menina obedeceu às ordens do Mouro e passadas as sessenta noites, levantou mais cedo do que nunca, pegou na bolota que tinha escondido num buraco da parede do curral e com o rebanho dirigiu-se ao pasto.

Mal pousou a bolota no penedo, a fresta abriu e muitas peças de ouro brilhavam lá dentro.

Tirou-as e levou-as para sua casa.

A partir desse dia, nunca mais soube o que eram as dificuldades da vida, nem ela nem os seus pais!

A bondade deles ajudou os mais necessitados daquelas aldeias serranas! Segundo rezam as lendas, muitos foram os Mouros que esconderam grandes tesouros nos penedos!

Alguns, permanecem escondidos nos segredos do tempo! Outros, como o deste penedo, foram encontrados e perderam o encanto, ajudando Mouros e Mouras voltarem à vida real!

Ao tirarem o tesouro, os penedos ficaram tão vazios e tão leves, que dá a sensação que qualquer rajada de vento os vai soltar e rolar pela serra abaixo!

Existem até penedos que o próprio homem faz baloiçar com a sua força! Magia, será?

Estes penedos que povoam o Montemuro, podem até baloiçar com a força do homem, mas jamais o homem os conseguirá soltar daquele pedacinho do chão!

São os mistérios indecifráveis do mundo lendário, o mundo mágico que nos leva a outras eras e a outros povos.

 

Publicado em
19/11/2021
na categoria
Caminhos na História
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Celeste Almeida

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