Ano de 1975!

Colocada em Pimeirô, recebi novo alvará para acumular minhas funções na escola de Ramires ou Vale de Papas, ambas as aldeias sem professores!

Embora tenham sido colocados vários, ninguém aceitou permanecer naqueles lugares tão genuínos e ao mesmo tempo, tão selvagens, para quem não fosse amante da natureza virgem!

Apesar da minha escolha ter sido fácil, pois iria voltar aos meus alunos de Ramires, queria conhecer a aldeia de Vale de Papas.

Em Pimeirô falava-se dela com um nó de silêncio que me apertava o peito.

Como era possível existirem outras aldeias com características mais pobres do que Ramires e Pimeirô?

Arquivo pessoal

Como?

Era domingo.

Numa manhã radiosa e preguiçosa , eu e Maria Teresa andamos em cima do mato dobrado na miséria. As giestas eram tão altas que nos escondiam dos calvários da vida.

Caminhos não existiam.

Era preciso rasgá-los.

Com as mãos afastávamos as ramadas para não sermos chicoteadas por elas. De vez em quando, tropeçava nalgum pedregulho, resistente à melancolia e solidão dos pastores.

Talvez, as mágoas das horas agrestes que eles contavam às fragas, fossem poucas para amolecerem tanta rocha!

Talvez!

Meia hora se passou e uma porta estreita abria-se ao mundo.

Outro mundo com o arco do horizonte a retemperar nossa energia.

Vale de Papas, uma das aldeias mais isoladas do Montemuro, recebia-me na sua pequenez. Um lugar, onde se tinha tudo, no mexer dos lábios das gentes que davam graças ao céu sereno.

Fotos do arquivo pessoal

As casas cobertas de colmo, mais pareciam um crivo por onde saía o fumo. A fonte era um veio fecundo que enchia um tanque, onde se via alguma roupa ensaboada no lavadouro.

Não havia tristeza nas almas daquelas pessoas que agradeciam a Deus a vida na terra, a terra que tão pouco lhes dava.

Vale de Papas, uma aldeia estendida na liberdade acorrentada na paisagem tricotada com fios de ouro, num vale de esperança.

Aos meus olhos aquele cenário era de uma beleza única por onde meu coração voava.

Voava tal borboleta amarelinha que me seguia, pousando de giesta em giesta!

 

 

 

Publicado em
1/5/2022
na categoria
Caminhos na História
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Celeste Almeida

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